Luiza de Marilac Cruz de Lima, 69 anos, nasceu na sede Apuiarés e, aos vinte e nove anos, passou a residir na comunidade Boa Vista, na propriedade Bela Vista, próximo ao município. Filha de cinco irmãos, sempre ajudou os pais, Antônio Dionício e Sauvina Cruz, na agricultura.

Desde muito jovem, Marilac manteve contato com a agricultura e com atividades do campo. Apesar de ter cursado até o quinto ano do ensino fundamental, enfatiza que não troca sua formação aquela época pelos ensinos atuais. “Hoje tem muito conteúdo sem muita prática, aplicam conhecimentos desnecessários. Tive pouco estudo, mas aprendi muito. Na minha época, havia muita prática, e não tínhamos comodidade e a dependência da tecnologia”.

A juventude de Marilac foi marcada pela dedicação dela na busca de conhecimento e de ajudar o próximo. Em um período sem energia elétrica e transporte para se locomover para outras comunidades, Marilac estudava em casa à luz de lamparina e acordava cedo nas férias do colégio para ajudar os pais na agricultura. Andavam até oito léguas para realizar as atividades da agricultura.

A agricultora conta que sempre arranjava tempo para ajudar os pais, e que residir na sede de Apuiarés não impedia de ir para comunidades locais com eles e os irmãos para plantar e colher. Com o tempo, só fMarilac ficou com os pais. Os irmãos foram embora e, como ela não queria sair de perto do campo e da família, decidiu ficar em Apuiarés.

Marilac passou a residir com os pais na comunidade de Boa Vista pouco tempo mais tarde e, no mesmo ano da mudança, casou-se com Antônio Napoleão, 68 anos, resultando em quarenta anos de casado. O casal passou a morar em outra casa próxima da casa dos pais de Marilac, assim podendo ajudar a mãe dela nas atividades de casa e o pai dela na agricultura. Foi quando veio o primeiro filho, aos trinta anos, e Marilac teve que se dedicar somente à nova família. No total, Marilac teve oito filhos, aos quais ensinou a cada um a importância da agricultura e do campo que aprendeu com os pais, repassou todo o conhecimento que adquiriu em sua vida a eles. Dos oito filhos, apenas dois permaneceram na comunidade e deram continuidade aos ensinamentos da mãe.

Com a morte do pai, Marilac passou a residir com a família na casa dos pais dela. Depois de décadas, a mãe dela também veio a falecer, e ela ficou à frente da família e da comunidade.  Marilac repassou para a comunidade ainda jovem todo o conhecimento que tinha, se tornou líder e referência local. Trouxe os conhecimentos católicos para ensinar catecismo, os conhecimentos de campo e agricultura familiar para orientar os jovens sobre as oportunidades locais e os conhecimentos de vida pra motivar outras pessoas a persistir e alcançar seus objetivos.

Participante ativa de movimentos sociais, feiras da agricultura familiar e sindicato dos trabalhadores rurais, emponderou-se como protagonista local e orientou não só a família dela, mas uma comunidade inteira. “Ainda com meus pais vivo, gostava de participar das reuniões da comunidade. A minha presença estava cada vez mais ativa, trazendo discussões sobre a participação política e social da comunidade. Sentia a necessidade de desenvolvimento e envolvimento da comunidade como um todo para o melhoramento local. Quando de fato fiquei a frente de Boa Vista, mostrei o quanto era importante abrir espaços para as diferentes expressões de participação social, e que elas constroem protagonismos que dão vida e sentido ao mundo, queria fazer mais, e fiz, hoje tenho orgulho de tudo aqui construído”. Enfatiza Marilac.

Em 2010, participou de um feira da agricultura familiar com o apoio da Adel. Por intermédio desta parceria, pode ingressar em uma capacitação disponibilizada pela organização para fortalecer os conhecimentos técnicos sobre o campo. Este ano, ingressou na rede néctar do sertão como participante dos grupos de meliponicultores da comunidade de Boa Visa e presidente da associação local. “É muito importante fortalecer a economia da comunidade com atividades que viabilize a conservação da natureza, a meliponicultura é uma delas, tenho poucas caixas de abelhas sem ferrão, mas juntando as minhas com a de outros produtores da comunidade já temos uma boa produção”, complementa Marilac.

Apesar de estar um pouco limitada devido à idade, ainda participa das atividades da comunidade, de capacitações e movimentos sociais em busca de mais conhecimento. Hoje, enxerga outra moradora da comunidade como sua sucessora e acredita que será uma ótima pessoa para dar continuidade ao seu legado.  “Sou uma idosa de 69 anos, mesmo sem poder fazer tudo o que tenho vontade, me sinto feliz porque ainda posso exercer alguns deles, continuo sendo um incentivo e exemplo para a comunidade. Falo sempre na reuniões aqui da comunidade que vinhemos ao mundo com uma missão, e que temos que aproveitar essa oportunidade que Deus nos concedeu porque quando ele nos chamar de volta será rápido, por isso temos que nos dedicar muito e logo, pois temos que fazer sempre a nossa parte para que ele possa no ajudar. Viver em um ambiente que se vive bem com a família, com os vizinhos, com a comunidade e com a natureza é muito bom. Tenho a consciência tranquila porque fiz muito parte durante todos esses anos de vida.”.